A medida que conheço
venho sentindo uma impotência muda
Uma vontade de gritar o poema mais sublime e horrível que houveháhaverá
Sabendo de antemão sua impossibilidade
Como um ganso tento alcançar as águias
Como a chuva evaporo antes de inundar o solo estéril
Como a fome não mais existo quando saciado
Como o tempo sigo desmanchando as coisas
Como o espaço percorro aleatoriamente em abertura
Permito, assim, a aparente solidez do mundo
Lanço um olhar indolente trágico
Lambo as feridas da repressão por uma civilização
Chacoalho os estandartes ingênuos de tudo aquilo que foi abrigo ao frágil homem
Guilhotino o ser enquanto gozo nas entranhas dos entes
Entre ente e ente estupefato ouço o não-silêncio
Termino o poema de encontro ao seu inicio
Mas o percorro em espiral:
Mudo
13 comentários:
Sérgio, acho que o tempo não desmancha, só depura.
Mas como disse Lacan, temos que aprender a conciver com a falta.
Essa agonia de existir, saiba, todo ser pensante compartilha. Seé que isso é consolo.
OLá Lirica, quanto ao desmanche das coisas: Pensa bem, tu conheces alguma coisa existente no mundo sensível. Qualquer ente que seja, que dure para sempre, sendo eternamente depurado? Ou tudo que um dia existe em algum momento deixará completamente de existir, logo, o passar do tempo leva a esta extinção de tudo que foi criado.
Quanto a agonia de existir é alguma coisa pensar que outros tem. Mas estava me referindo especificamente a impotência diante dos mistérios gerada por aquele que busca a sabedoria. abraço
Como bem pintou João Cabral de Melo:
"Fazer o que seja é inútil.
Não fazer nada é inútil.
Entre fazer e não fazer.
Mais vale o inútil do fazer."
Poemaço. Achei formidável o 'houveháhaverá'. E também o final: mas percorro em espiral: mudo. Esse mudo para mim abre dois significados, no mínimo.
Adorei mesmo.
Oi André, fui procurar este poema do Cabral! Tenório, eu custumava juntar palavras com muita frequência, mas acabei tentando criar poemas mais simples, analiticamente falando. Mas com sempre digo, o poema é um cristal que observado por um determinado angulo reflete uma "verdade" diferente. A tua observação sobre o trecho: "percorro em espiral: mudo". Revelando dois significados para mudo já é uma prova das possibilidades interpretativas do poema. Abraço amigos.
"Termino o poema de encontro ao seu inicio
Mas o percorro em espiral:
Mudo"
Sérgio, toda a existência é luta. E quanto maior a ciência, maior a dor. Mas as coisas podem durar para sempre, sim... os organismos vivos é que não.
Bom Lírica, aí tu estás afirmando a existência de entidades como alma e Deus, que tem no conceito a característica de serem eternos. Mas estes dois conceitos, assim como qualquer outro ente que seja eterno, não podem ser provados através de dados empiricos. Isto é, através do conjunto de coisas existentes no mundo tal qual conhecemos. Assim, é uma questão de fé. Aquilo que está fora do mundo não pode ser provado, mas pode ser acreditado ou desacreditado. De qualquer maneira, o tempo é um conceito que existe no mundo e não fora dele onde para quem tem fé existem estas outras entidades eternas. Logo, onde há tempo as coisas são finitas´. Portanto, não duram para sempre as coisas que existem no tempo. Era a essa proposição que a metafora usada no poema se referia.
Sérgio, sem querer ser chata... mas talvez já tendo sido desde o início, Shoppenhouer cita em "O Mundo como Vontade e como Representação" que não é o tempo que desgasta as coisas, mas imposição da Vontade (movimento) de outros elementos... como clima, atrito... Entendam-se aqui, "coisas" como objetos. Mas isso nemtem nada a ver com o seu poema, né? Nele vc diz que desgasta, como o tempo, as coisas. Então creio que isso fala da imposição da sua Vontade (ação) sobre as coisas, deixando sua marca.
Ah, mais uma coisa: acredito que os entes continuem a existir em outras formas no ciclo da vida. Mas isso é outro assunto.
Lírica, não tem problema que tu queiras expressar tua opinião, acho até interessante que o poema desperte as pessoas.
Realmente, embora seja interessante a alternativa de Schopenhauer da vontade como movimento do mundo. A frase " Como tempo sigo desmanchando as coisas" era uma metáfora para aquilo que é observável na natureza: A finitude das coisas do mundo. O que realmente causa isso nós não sabemos exatamente, só sabemos que o que está aqui hoje não estará num outro momento futuro no tempo.
Como eu disse antes, a respeito das possibilidades de existência de forma não observável é uma questão de fé.No qual não teremos um ponto de contato necessário para discutir. Logo resta crer, suspender o juízo ou descrer.
que final bonito.
gostei.
bjbj
muito bom.inteligente e mostra a bagagem que tem...parabes mesmo!!!!
Postar um comentário