quinta-feira, 8 de outubro de 2009

a chuva entrou

estudo para aquarela/ rafael godoy

a chuva veio e não fechei as janelas
as ruas estão alagadas e as pessoas cinzas
há alguns guarda-chuvas esquecidos
ninguém procura por eles

a água entrou e molhou meu livro de cabeceira
as páginas ficaram enrugadas
como o rosto da velha que toma chá
com os retratos amarelados em sua sala

a chuva molhou um guardanapo de papel
em que tinha escrito um poema
sobre o dia em que você se foi

olhei a chuva entrando e não fechei as janelas
deixei que ela molhasse meu rosto e meus cabelos
os guarda-chuvas ali esquecidos
e os panos de chão pendurados no varal

25 comentários:

Lara Amaral disse...

Quando há chuva, a gente se entrega, e deixa que ela cuide do resto. Muito bonito, Adriana. Beijos!

Talita Prates disse...

Achei o poema mais suave que o de costume, Adriana.
Acostumei-me a levar "trancos" lendo teus textos...
Isso não quer dizer, no entanto, que eu não tenha gostado: gostei muito!

Bjo grande, querida.
:)

sopro, vento, ventania disse...

Concordo com Talita sobre a suavidade desse seu poema. Ler você é sempre uma novidade, um 'outro algo inesperado por vir'. E isso é muito legal. E o mais interessante é que, suave ou não, visualizo cada cena de cada palavra que escreve. E às vezes choro e às vezes rio, rio. (Como no poema anterior, o "sem noção"). E fico feliz por ter tido a felicidade de encontrar você e suas palavras, que me fazem acender a vontade de nunca mais parar de escrever.
Sobre esse seu poema, lindo demais.
O guarda-chuva esquecido, a saída sem proteção da água que vem de cima, e os panos estendidos, resquícios da limpeza da água que está abaixo de nossos pés (e que lava tudo, leva tudo embora); e os panos estendidos, prontos pra começar tudo de novo, em outras futuras histórias nossas.

Me lembrou a música que Elis (en)canta: "As aparências enganam, aos que gelam, aos que inflamam, pq o fogo e o gelo, se irmanam no outono das paixões."

Tudo de novo e de novo, sempre, não é?

beijo grande,
Cynthia

José Carlos Brandão disse...

Gostei, gostei muito, Adriana. Suavidade da chuva lavando a alma, entrega amorosa - nem que seja à solidão... Mas há um ar, uma água - de libertação, de purificação no teu poema. Poesia encharcada - coisa necessária.

Beijo.

Sidnei Olivio disse...

Grande poema. Abraços.

tania não desista disse...

oi,adriana! a maioria já vivenciou essa chuva...que molha o que não devia!...que pode nos fazer chorar...pelo livro rasurado
...pelo poema perdido.
mas,também,encarar como "benção"
molhar rosto e cabelos .
lindo poema ...linda chuva!
bjos
taniamriza

Fred Matos disse...

Muito bom poema, Adriana e também a aquarela do Rafael.
Beijos

L. Rafael Nolli disse...

De minha parte eu não achei mais suave que o habitual. Achei esse belo poema no mesmo ritmo de sempre - forte, trata de modo contundente a perda, a desilusão, sem concessão para o piegas. Muito bom.

(sobre a parceria com Rafael Godoy: excelente!)

Audemir Leuzinger disse...

adorei!!!

BAR DO BARDO disse...

Chuva. Lava. Isso...

TON disse...

Chove lá fora e aqui, faz tanto frio ...

Palavras húmidas, versos molhados e lembranças encharcadas.

Empatia.

Ton

Wilson Torres Nanini disse...

A chuva pode dissolver papéis, mas a poesia é imperecível!

Barone disse...

Fortíssimo, isso sim.

Roberto Ney disse...

Que blog bacana... uma bela reunião de grandes poetas da modernidade.
Como amante da poesia, baterei meu ponto por aqui sempre!
beijo pra quem é de beijo.
abraço pra quem é de abraço!

Adriana Godoy disse...

O que posso dizer a cada um de vocês é que fico envaidecida com esses comentários. Agradeço a todos que passaram poer aqui e deixaram essas palvras tão expressivas, o que dá força pra continuar. Beijos.

pianistaboxeador21 disse...

Triste.

Beijo

Úrsula Avner disse...

Muito bonito o poema Adriana, construção bem expressiva e rica, num tom saudosista e reflexivo. O desenho do Rafael é belo e ilustra bem o texto poético. Obrigada por seu carinho sempre presente. Bj.

Victor Meira disse...

Eu fico deslumbrado com as pinturas do Rafael. Caramba, que coisa.

E tá lindo, a sinergia com o poema é boa.

O poema é suave, de melancolia já domada. É agradavel e tristezinho. Lembro da minha mãe lá no interior.

Beijo.

Anônimo disse...

imagético e forte (tão forte que dói "como o rosto da velha que toma chá/
com os retratos amarelados em sua sala").
grande texto, adri!

Hercília Fernandes disse...

Belíssimo, Godoy.

Poema paisagístico de primeira grandeza, desses que a gente quer habitar.

Lindo mesmo!

Um beijo :)
H.F.

Daufen Bach disse...

Olá minha cara!

... e fizeste bem, a chuva, qdio cai assim e é tao bem recebida, costuma lavar a alma e deixar correr enxurrada abaixo, aquelas coisas que estao grudadas e nao conseguimos nos livrar...

grande poema!!

parabéns a ti.

Felipe Costa Marques disse...

lavou alma, dri.

bjs e abs

Domingos da Mota disse...

Ainda bem que cheguei aqui e apanhei esta chuvada: belo poema.

Domingos da Mota

FC disse...

Escrever tem, exige, predisposição, disposição e posição, não é coisa fácil mas não deve ser difícil. Pois, para complicar um pouco, só sentindo uma certa facilidade a fluir, o discurso encontra seu curso e deixa sua marca com imagem nítida e legível. Hoje – como se escolhe um dia? – achei não dever adiar publicar algo no blog, lendo neste blog colectivo.

Estava a pensar comentar o texto que tivesse menos comentários, rendi-me ao que tinha mais comentários, deixo então (o) comentário. Sem grande vontade de dizer porque gostei do poema: transmite tanta intimidade e poesia, apetece ficar nesse lugar indefinido, onde o ser ganha seus contornos.

rogerio santos disse...

Adriana, engraçado.
Entrei no blog do Francisco Coimbra para retribuir uma visita ao meu (coisa que não consigo fazer com a frequência que deveria, visitar outros blogs) e peguei uma citação ao poemadia que me trouxe até aqui. E não me lembro de ter lido sua postagem.
Posso dizer com muita franqueza que o poema é feliz demais, na troca, na simbologia.
Um poema essencial.
Maravilhoso !

Beijos, Rogerio