O poema tem que ser ácido,
não por mim,
mas por Sacco & Vanzetti –
sentados em cadeiras onde serão eletrocutados.
O poema tem que ser ferino,
não por mim,
mas pelo Líbano novamente bombardeado –
e que será bombardeado até que os telejornais
se cansem de noticiar a desgraça dessa guerra.
(Que o verso noticie as crianças confusas,
as bibliotecas cheias de poesia,
as mulheres agarradas às barbas de Maomé,
os cedros cantados pelo profeta Ezequiel –
todos excluídos das estatísticas,
pois suas mortes foram desprezadas
por não venderem jornais
e atrapalhar o comércio bélico.)
O poema tem que ver além do seu próprio umbigo,
não por mim,
que muito sei do meu umbigo,
mas por todos aqueles que amanhã
acordarão desesperados –
eu e meu umbigo entre eles.
O poema tem que ser denunciante,
não por mim,
mas por Ruanda
que na Noite dos Facões
perdeu um milhão de seus filhos
para uma fábula belga
sem príncipe encantado ou final feliz.
(Que no poema escorra o sangue dessa gente
que ainda ontem estava viva,
donas de suas mãos e
cabeças decepadas pelos vizinhos,
onde buscavam o sal
que faltava para colorir as suas mesas escassas.)
O poema tem que ser visionário,
não por mim,
que mal posso ver além das brumas do agora,
mas por todos aqueles que mesmo vendados continuam
sem dosar os passos no campo minado das cidades.
(Que o poeta saiba cantá-los
sem se esquecer dos
crimes diários que a sociedade obriga-os a cometer
[Bakunin sorri nessa estrofe!])
O poema tem que ser dos homens,
respirar o mesmo ar que eles,
chorar os mesmos mortos,
estar ombro a ombro nas filas dos hospitais
ou nas trincheiras do desemprego,
não por mim, poeta, não por mim.
*
não por mim,
mas por Sacco & Vanzetti –
sentados em cadeiras onde serão eletrocutados.
O poema tem que ser ferino,
não por mim,
mas pelo Líbano novamente bombardeado –
e que será bombardeado até que os telejornais
se cansem de noticiar a desgraça dessa guerra.
(Que o verso noticie as crianças confusas,
as bibliotecas cheias de poesia,
as mulheres agarradas às barbas de Maomé,
os cedros cantados pelo profeta Ezequiel –
todos excluídos das estatísticas,
pois suas mortes foram desprezadas
por não venderem jornais
e atrapalhar o comércio bélico.)
O poema tem que ver além do seu próprio umbigo,
não por mim,
que muito sei do meu umbigo,
mas por todos aqueles que amanhã
acordarão desesperados –
eu e meu umbigo entre eles.
O poema tem que ser denunciante,
não por mim,
mas por Ruanda
que na Noite dos Facões
perdeu um milhão de seus filhos
para uma fábula belga
sem príncipe encantado ou final feliz.
(Que no poema escorra o sangue dessa gente
que ainda ontem estava viva,
donas de suas mãos e
cabeças decepadas pelos vizinhos,
onde buscavam o sal
que faltava para colorir as suas mesas escassas.)
O poema tem que ser visionário,
não por mim,
que mal posso ver além das brumas do agora,
mas por todos aqueles que mesmo vendados continuam
sem dosar os passos no campo minado das cidades.
(Que o poeta saiba cantá-los
sem se esquecer dos
crimes diários que a sociedade obriga-os a cometer
[Bakunin sorri nessa estrofe!])
O poema tem que ser dos homens,
respirar o mesmo ar que eles,
chorar os mesmos mortos,
estar ombro a ombro nas filas dos hospitais
ou nas trincheiras do desemprego,
não por mim, poeta, não por mim.
*
9 comentários:
Lindo, Nolli!
Acho que apenas lancei o tema
e você discorreu sobre ele
com propriedade ímpar!
Um abração, colega!
Grande poema, Nolli. Grande lição de poesia. Abraço.
Rafael,
seu poema é um tratado, mas dos bons!
Destaco a passagem:
"O poema tem que ser visionário,
não por mim,
que mal posso ver além das brumas do agora,
mas por todos aqueles que mesmo vendados continuam
sem dosar os passos no campo minado das cidades".
Bravo, bravíssimo!
Beijos,
H.F.
o poema tem que ser esplêndido !
O poema tem que ser forte e denunciar a vida e a morte. E ainda assim, ser belo. Parabéns,
Helena
Então, isto é um poema. Soberbo!
Ton
Finíssimo. Quando a gente elogia, não é elogia só uma coisa: é que no Nolli tudo se encontrou: tem estilo, voz, indica uma unidade consistente na obra do autor, vai caminhando ao lado do que é atual, além de ser poesia atemporal. Muito bom, camarada!
Muito bom Rafael.
e por todos que amanhã estarão despedaçados!
adorei.
bjbjbj
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