domingo, 18 de outubro de 2009

Compondo Paredes

O laço no cabelo se abriu
e o vento a brincar
cobriu-lhe o rosto...
E isto posto
o que me restou
além do franzir de testa,
foi fechar os olhos
e imaginar tudo aquilo,
que sempre aniquilo
ao lembrar
dos seus olhos de menina.

Os dias de novembro se vão
e os ventos que murmuro
não te trazem aqui.
Feliz sou eu
que não te tenho,
pois meu querer ferrenho
não te protegeria de mim.

Mantenha-se longe
E o mais distante que possas...
Para que as vontades nossas
possam se esvair enfim.

Em mim,
essa vontade absurda
de viver o que não posso.
E esse desejo que destroço,
se recompõe,
a cada manhã,
a cada canção,
e a cada brisa.

Nesse ofício de poeta,
Ou do cantor de cada tarde,
eu calo a vida que arde...
E vivo... compondo paredes
para te deixar assim...
providencialmente...
longe de mim.


Anderson Julio Lobone

4 comentários:

RAUL POUGH disse...

Taí, meu caro! Gostei disso! Interessante... O poema até poderia se chamar "Ensaio sobre a renúncia".
Quando você diz: "eu calo a vida que arde..." me faz lembrar do Jamil Snege, na lindíssima crônica "Para matar um grande amor". No teu poema você busca o que o Snege chama de "dom da finitude", que só os grandes amores tem. Diz ele: "O amor relativiza; a renúncia absolutiza". Com isso, claro, vem a dor e sentimentos sombrios! "Que se curam algum tempo depois com um amor vulgar, desses feitos para durar uma
vida inteira..." nas palavras do mestre Jamil. Abç.

http://raulpough.blogspot.com/2007/04/para-matar-um-grande-amor-jamil-snege.html

Heyk disse...

"ao lembrar
dos seus olhos de menina."
é engraçado. esse verso destoa, anderson da primeira estrofe, corta ela, desritma.

Mas ao mesmo tempo, é ele que dá ao poema o corpo que segue. O corpo do amor perdido que sabes que é pra ficar perdido.

Dá pra tirar essa primeira parte e poema fica inteiro. mas como pano de fundo, como desculpa pra rasgar-se em versos de amor, ele entre bem.

ah, tem uma coisa interessante no poema, é impossível ler ele fora das quebras que você propõe, tanto o som como o ritmo estão a serviço completamente dos versos. Curioso isso.

Ton disse...

Começa com uma pintura e termina como um borrão distante de quem queria ficar mas teima em partir.

É de uma tristeza só possível com a compaixão, não desesperada.

Ton

Felipe Costa Marques disse...

Excelente ao quadrado!

muito bom!