Onde te escondeu
No fim daquele dia
Eu ainda conto
Aquelas horas
E você ainda vai embora
Todas as manhãs
E não volta
E talvez seja por isso
Que não quero um filho
Eu te dei a extrema unção
Pai
Te toquei a testa
Atirei o primeiro punhado
De terra
Mas fui buscar teus dentes
No outro dia
Para colocar em minha boca
Sempre foi você
No meu rosto
Sempre fomos
Uma mesma parte
Em seu caráter
Herdei de ti
O amor à mulher
E seu vício
A dureza do que é reto
A diferença
É que sou minha própria medida
Eu crescia
E ia em tua direção
(mesmo no sentido contrário)
Você mais velho
Vinha a mim
Criança em sua esperança
E fizemos uma ciranda
Com nossos passos
Trocados
Eu herdei de ti
A vontade de voltar
Everton Behenck
17 comentários:
Nossa! Que poema belo! Li e meu coração ficou apertado. Vai direto na alma,como se fossem dedos suas palavras.
"Eu herdei de ti
A vontade de voltar" Bonito demais.
A mesma sensação descrita pela Adriana... Que bonito, Everton!
Caramba! Muito, muito bom! De engasgar... Parabéns!!!!!!!
Linda equipe,
é lindo este poema de vocês. E vocês não imaginam o almaço de linhas que me deu. Juro! ainda mais, por um acaso destes da vida entre duas paredes de papel, o verso "para colocar em minha boca"
lembrou-me um surdo soneto meu saído em dias de trovoadas iguais. Ei-lo aqui:
Deixa que eu seja a intriga ou a flor,
A lingüiça no prato que não queres,
A mais sonsa de todas as mulheres,
A santa no alto do seu andor.
Deixa que eu seja das fronhas o alvor,
A Inês que já é morta, o que quiseres!
A ambulância louca, seja o que for!
Tu serás corrimão em meus prazeres.
Chega-te mais, amor, vem, faz biquinho...
Põe meus fartos seios em tuas mãos,
Dois melões ardendo no mesmo ninho...
Vem comigo dançar na cena mais louca
E explodir, na confluência dos vãos,
Uma Via-Láctea em minha boca!...
Beijos prenhes da poesia mais sincera,
Viviana
É de se ler chorando, literalmente.
Belo, singelo, intenso e comovente.
Certa vez li um texot que dizia mais ou menos isto: ... quando tive meu primeiro filho, pude compreender meus pais. Quando tive meu segundo filho, pude compreender um pouco Deus, por perceber como é possível amar a mais de um e a cada um como se fosse único.
Pois é. Um poema daqueles que não se vê sempre - forte, de doer no osso, de uma beleza incomoda. Poema raro, que não perde a força nem o poder de incomodar e de deslumbrar - coisa rara no mundo virtual, de se ver na poesia contemporanea. Deixou o Poema Dia muito mais rico e vistoso. Simplesmente um poema para se ler e reler outras vezes mais. Parabéns.
Realmente tocante no instante a memória, a saudade, a linealidade e distinção dos genes.
Meu Deus! Misturou O Estrangeiro de Camus, fez poema da perda mais dura pra um homem, traçou a linha da memória com mão firme na ponta do verso bem feito. Muitíssimo bom! Tremendo poema
Excelente! Tendemos a achar ótimos os escritos emotivos, mas achei este excelente não pela carga emotiva apenas, mas pelo ritmo e concatenação da idéia e sem cair na pieguice.
belo poema. parabéns para o autor.
abs
Chorei!
:-)
"Mas fui buscar teus dentes
No outro dia
Para colocar em minha boca"
Gostei.
Comovente, Everton!
Excelente!
Belíssimo poema. Gostei muito. Vou lê-lo de novo.
É um dos meus preferidos!
Um poema único
"A diferença
É que sou minha própria medida"
Felicidades!
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