sábado, 3 de janeiro de 2009

ao pó (através do Gita)

um poeta escreveu um livro
please, plant this book, richard brautigan
um livro de instruções
os poemas eram rótulos em saquinhos de sementes
nenhum grão de mostarda
no espaço do jardim quero:
horta, pomar, bosque e labirinto

sweet alyssum royal carpet
sasha daisy
squash star fruit aspen
parsley
alface california native flower
carnation willow water violet
cenouras flor-de-mel pomegranates
calendula

penso se alguém seguiu suas orientações
queria plantar meu livro de poemas
não possuo semente alguma
nem livro algum
plantarei este poema
e as flores que brotarem
deverão ser colhidas pelos longos dedos enlutados de
uma verdadeira dama da noite

estranhos negócios estes que temos com a terra
feitos dela
pesados como ela
esta intransferível passagem de ida e volta que recebemos
antes de chorar

os coveiros deveriam reflorestar
madeira para ataúdes
replantar as mesmas árvores
que os romanos usavam para fazer cruzes

falo ao carpinteiro que me conta estórias
as primeiras idéias sempre vão para o solo
diz mais saber das águas e dos ares
e que a terra tampouco lhe foi leve:
não me interessa o que vira pó
paletós de madeira e afins
já que sabes do pó ao pó
concentre-se na jornada

a cada vez que deus inspira
nos sentimos voltando para casa

23 comentários:

Barone disse...

Grande Audemir. Beleza de poema!

Hugo Langone disse...

Beleza mesmo! Relendo.

d'Angelo Rodrigues disse...

Além de pérolas como "estranhos negócios estes que temos com a terra", "esta intransferível passagem de ida e volta que recebemos", um final majestoso. Clap, clap, clap, Audemir.

Beatriz disse...

Inspirado, magnífico. intimidade intensa com as irmas em línguas diferentes sem perder os signos.
Ah! é muito bom e riquíssimo.

Beatriz disse...

ei, irmas, não.
disse rimas, ok?

Maria Cintia Thome Teixeira Pinto disse...

Concentremos nosso viver aqui em falar, escrever à buril, cravando palavras de Amor e afeição, pois nada seremos além de pó neste lugar, lembranças só talvez as letras se não houver um fogaréu e levar às estrelas ...mas em algum lugar que sabemos que existe seremos plenos de missões e das verdadeiras delícias da alegria ...
Parabéns, emociona.ab

L. Rafael Nolli disse...

Belo poema. Muitas sementes nesse poema. Muitas.

Marcos Pontes disse...

Da referência à reverência, do pó ao talco e de volta ao pó, o cíclico das letras ao papel e à madeira de caixão. Poesia de verdade. Como diria o Benny, "de prima".

Adriana Riess Karnal disse...

todos os jardins se renovariam na terra se adubados no sulco das águas, no ventre do vento,só à terra há de comer a madeira.Belo poema!

Benny Franklin disse...

Putz! Que poema, hein, Audemir!

Assis de Mello disse...

Audemir, além da excelência desse poema, achei demais a referência a Richard Brautigan, um poeta totalmente ignorado aqui, mas um dos melhores dentre os associados aos Beat.
Pelo que me consta, um romance dele (Trout Fishing in America) teve duas edições aqui no Brasil, mas nenhum de seus livros de poemas foi traduzido ao português. É uma pena, pois além de ele ser um dos melhores poetas Beat que se identificam com a natureza e a vida no campo, ele cria figurações belíssimas e tem um lirismo impressionante. Além do mais, o inglês dele é muito simples e fluido. Seria muito interessante traduzí-lo.
Um abraço e parabéns pela postagem.
Chico

Márcia Maia disse...

uau! que poema!
um final majestoso. e esses longos dedos enlutados de
uma verdadeira dama da noite
são um verdadeiro achado.

adorei,Audemir. bravíssimo!

Fábio Terra disse...

Fabio Terra diz, infelizmente não consegui postar o meu poema tive um problema aqui vou ser obrigado a usar o seu espaço de comentários espero que entendam

Fabio Terra

Fábio Terra disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fábio Terra disse...

Tentarei no decorrer do dia posta-lo

Fábio Terra disse...

Periclitante.

Joe_Brazuca disse...

reflorestou, frutificou,morreu,retornou ao backstage, isnpirou com Ele...D+ !

rogerio santos disse...

o grande poema é de quem semeia palavras e sabe do cultivo de árvores, apenas pelo prazer de, no momento propício, comer um fruto maduro, subir no alto do pé, de lá pular e, quem sabe.... voar !

Anônimo disse...

Audemir, plantaste uma importante reflexão com a tua bela poesia. Lindo!

Anônimo disse...

Cada vez melhor... Parabens amigo. Beijos.

Anônimo disse...

Desfaleço com poemas do mestre.

Day disse...

Audemir, meu querido,
queria ter comentado essa poesia no dia em que a li, mas estava sem PC.

que coisa, hein?

nossa... vou lê-la, se você permitir, na proxima Ciranda em março.

(eu estou lá, inclusive: (sasha daisy) hhohoh..

belíssima!

mil beijos e saudades...

(quando virá até aqui, pós serra da Grota Funda, num domigo pra ouvir o excelente repertório do Kaká?)

em tempo. A pedra de Toque nao está morta. está engavetada por mil coisas que apareceram no percurso. nao pense que se livrou de mandar um texto!

estou relendo mrs. Dalloway - impossivel nao pensar em você!
Beijos

Day

Kelly di Bertolli disse...

Tremi em flor lendo sua semente que germinou na minha imaginação.
bjs
k